segunda-feira, 29 de setembro de 2014

PROJETO DE LEI DO RETORNO DO CDS-PP PARA OS JUDEUS SEFARDITAS PORTUGUESES

A seguir reproduz-se, na íntegra, o projeto de alteraçom à lei da nacionalidade apresentado a 4 de abril de 2013 polo Grupo parlamentar do CDS-PP para conceder a naturalizaçom portuguesa aos descendentes de Judeus expulsos de Portugal, nos séculos XV e XVI, promover o seu retorno e reabilitar a sua imagem. O projeto, ao igual que o apresentado polo PS, comporta umha alteraçom à Lei da Nacionalidade.


PROJECTO DE LEI N.º 394/XII/2ª
Quinta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro 
(Lei da Nacionalidade)
Nacionalidade portuguesa de membros de comunidades de judeus sefarditas expulsos de Portugal

Exposição de motivos

Designam-se de judeus sefarditas, os judeus descendentes das antigas e tradicionais comunidades judaicas da Península Ibérica (Sefarad), provindo a designação do hebraico Sefardim (Sefardi, no singular).

É muito antiga a presença destas comunidades no território peninsular, acreditando-se que aqui se estabeleceram ainda durante a era das navegações fenícias, embora a sua presença só possa ser atestada desde o Império Romano. E aqui permaneceram nos alvores da cristianização, bem como nas subsequentes invasões quer visigótica (e cristã), quer moura (e muçulmana). Eram, portanto, comunidades pré-existentes à formação dos reinos ibéricos cristãos, como foi o caso da formação de Portugal a partir do século XII.

Estas comunidades judaicas foram objecto de perseguição por parte da Inquisição espanhola, a partir de finais do século XV, datando as primeiras expulsões de 1492. Muitos refugiaram-se na altura em Portugal, onde as perseguições ainda não se verificavam e, pelo contrário, uma lei inicialmente promulgada por D. Manuel lhes garantia protecção. Porém, este quadro rapidamente mudaria e também o rei português D. Manuel determinou, a partir de 1496, a expulsão de todos os judeus Sefarditas (também conhecidos por Marranos) que não se sujeitassem ao baptismo católico. Numerosos judeus foram, assim, expulsos de Portugal nos finais do século XV e inícios do século XVI – tanto aqueles que, dos vizinhos reinos de Castela e outros, se haviam refugiado transitoriamente no nosso país, como os membros e descendentes das antigas e tradicionais comunidades judaicas estabelecidas em solo português.

De modo geral, estes judeus peninsulares fugiram para países como a Holanda e o Reino Unido e para o Norte da África, bem como, mais tarde, para territórios americanos, correspondentes actualmente a Brasil, Argentina, México e Estados Unidos da América. É ainda aí que, hoje, encontramos os descendentes das comunidades expulsas de Portugal, ocorrendo a maior frequência de casos no Brasil e também nos EUA.

Apesar das perseguições e do longo afastamento do seu território ancestral, bem como do facto de, para sobreviverem, terem tido, em vários períodos, que seguir secretamente as suas tradições ou mesmo que interromper a sua prática, muitos judeus sefarditas transmitiram o sentimento português de geração em geração. Nomeadamente, muitos mantiveram ritos e objectos tradicionais, típicos do antigo culto judaico em terras do nosso país, e foram conservando e reproduzindo os seus apelidos portugueses, além de cultivarem uma forte relação memorial a Portugal.

Citam-se, designadamente, os seguintes apelidos Judeus-Sefarditas oriundos das regiões do Alentejo, Beira-Baixa e Trás-os-Montes:
Amorim; Azevedo; Álvares; Avelar; Almeida; Barros; Basto; Belmonte; Bravo; Cáceres; Caetano; Campos; Carneiro; Carvalho; Crespo; Cruz; Dias; Duarte; Elias; Estrela; Ferreira; Franco; Gaiola; Gonçalves; Guerreiro; Henriques; Josué; Leão; Lemos; Lobo; Lombroso; Lopes; Lousada; Macias; Machado; Martins; Mascarenhas; Mattos; Meira; Mello e Canto; Mendes da Costa; Miranda; Montesino; Morão; Moreno; Morões; Mota; Moucada; Negro; Nunes; Oliveira; Osório (ou Ozório); Paiva; Pardo; Pilão; Pina; Pinto; Pessoa; Preto; Pizzarro; Ribeiro; Robles; Rodrigues; Rosa; Salvador; Souza; Torres; Vaz; Viana e Vargas.
Por seu turno, encontramos os seguintes apelidos em famílias Judaico-Sefarditas na Diáspora na Holanda, no Reino Unido e nas Américas:
Abrantes; Aguilar; Andrade; Brandão; Brito; Bueno; Cardoso; Carvalho; Castro; Costa; Coutinho; Dourado; Fonseca; Furtado; Gomes; Gouveia; Granjo; Henriques; Lara; Marques; Melo e Prado; Mesquita; Mendes; Neto; Nunes; Pereira; Pinheiro; Rodrigues; Rosa; Sarmento; Silva; Soares; Teixeira e Teles.
E, por último, é comum encontrar os seguintes apelidos Judaico-Sefarditas na América Latina:
Almeida; Avelar; Bravo; Carvajal; Crespo; Duarte; Ferreira; Franco; Gato; Gonçalves; Guerreiro; Léon; Leão; Lopes; Leiria; Lobo; Lousada; Machorro; Martins; Montesino; Moreno; Mota; Macias; Miranda; Oliveira; Osório; Pardo; Pina; Pinto; Pimentel; Pizzarro; Querido; Rei; Ribeiro; Robles; Salvador; Solva; Torres e Viana.
A matriz portuguesa de muitos destes nomes de família é bem suficientemente evidente, a par de outros de clara matriz castelhana.

Descendentes há dessas comunidades judaicas que nunca esconderam o desejo de recuperar a antiga nacionalidade de que estão privados pela expulsão dos seus antepassados. E esse tema tem sido objecto recorrente de reflexão normativa e de tratamento quer em Espanha, quer em Portugal, em diferentes momentos históricos. Em Portugal, nunca foi, porém, estabelecida uma solução satisfatória e duradoira.

Em 2010, correndo a 11ª Legislatura, o Grupo Parlamentar do CDS-PP interessou-se por esta problemática, respondendo à abordagem feita por «representantes da comunidade de judeus sefarditas, residentes no estrangeiro, que desejam poder recuperar a nacionalidade [portuguesa] que foi a de seus antepassados». Neste contexto, o deputado José Ribeiro e Castro, que era também na altura o presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, formulou perguntas parlamentares ao ministro da Justiça e ao ministro da Administração Interna do XVIII Governo Constitucional (governo minoritário do PS, presidido pelo primeiro-ministro José Sócrates).

Na altura, em 2010, corria também uma petição electrónica, intitulada «Restituição da Nacionalidade Portuguesa aos Judeus Sefarditas Portugueses», que pedia o seguinte: «Assim sendo, nós, cidadãos portugueses, através dos signatários desta petição, vimos solicitar perante os Poderes constituídos da República Portuguesa, a restituição da nacionalidade portuguesa aos judeus sefarditas portugueses.»

Esta petição, dirigida à Assembleia da República e cujo primeiro subscritor é Marco António da Silva Moreira, recolheu já a assinatura de 1.181 pessoas já subscreveram, não deu entrada oficial e permanece aparentemente ainda pendente no seu endereço electrónico < http://www.peticaopublica.com/?pi=SEFARDIM >. A mais evidente sequência parlamentar que teve correspondeu às perguntas parlamentares do CDS, que retomaram vários dos fundamentos desta.

Tratou-se, respectivamente, das perguntas parlamentares n.º 2835/XI/1ª e n.º 2837/XI/1ª, ambas de 10 de Maio de 2010, mais tarde renovadas como perguntas parlamentares n.º 4034/XI/1ª e n.º 4032/XI/1ª, ambas de 8 de Julho de 2010.
Aí, alegava-se:

b) «Os judeus sefarditas foram expulsos de Portugal ou forçados ao exílio a partir das perseguições de finais do século XV, continuando a considerar-se e a referir-se a si mesmos como “judeus portugueses” ou “judeus da Nação portuguesa”.

c) Presentemente, constituem um grupo pequeno, tendo alguns membros cidadania israelita, sendo que a maioria vive no Brasil na maior parte do tempo e correspondendo quase todos a indivíduos com educação de nível superior, em geral profissionais liberais e que, na maioria, falam mais do que o português.

d) Há muitos judeus sefarditas que aspiram a recuperar a nacionalidade portuguesa, de que se encontram privados mercê da expulsão e/ou exílio forçado dos seus antepassados.

e) A Espanha – que fez expulsões similares às ocorridas em Portugal – já adoptou legislação, desde 1982, que permite a naturalização dos judeus sefarditas de origem espanhola ao fim de dois anos de residência em Espanha, à semelhança da norma aplicável a um conjunto limitado de origens específicas. E, em 2008, adoptou a possibilidade por “carta de natureza” e atribuiu a nacionalidade espanhola, independentemente de residência, a judeus sefarditas, mercê unicamente de um conjunto de indicadores objectivos (apelidos, idioma familiar) e competente certificação pelo rabino da comunidade.

f) Os judeus sefarditas interessados em recuperar a nacionalidade portuguesa sublinham que outros países, como a Grécia, já adoptaram legislação de reaquisição de nacionalidade por judeus expulsos e seus descendentes e que a própria Alemanha o fez, face à tragédia mais recente.

g) Portugal é dos poucos países, senão o único, que não dispõe ainda de normas para reaquisição de nacionalidade pelos descendentes de judeus expulsos.»
Pretendia, então, o CDS obter resposta do Governo da altura às seguintes questões:
1. «Tem conhecimento da situação e desta aspiração dos judeus sefarditas de origem portuguesa?
2. Considera que é possível atender a sua pretensão de reaquisição da nacionalidade portuguesa, no quadro da lei e da regulamentação vigentes? Por que modo?
3. Não havendo legislação vigente que possa satisfazer a aspiração dos judeus sefarditas de origem portuguesa, está aberto a que possa ser adoptada proximamente? Concorda nomeadamente com a adopção em Potugal de um regime de naturalização dos judeus sefarditas originários de Portugal similar ao que já vigora na vizinha Espanha?»

O ministro da Justiça responderia às questões do CDS-PP por resposta com data de registo na Assembleia da República em 14 de Julho de 2010 e que pode ser consultada no DAR, II - série B, Nº.171/XI/1, Supl. 2010.07.14 (pág. 99-100).

Aí, depois de enquadrar a questão no contexto da Lei da Nacionalidade vigente (Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro) e da sua evolução normativa (última alteração pela Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril), bem como de abordar genericamente o problema, o Governo da altura apontava para a possibilidade de consideração de casos individuais ao abrigo do disposto no artigo 6º, n.º 6 da lei, no uso do poder discricionário que aí é fixado, apontando para uma sua aplicação «de forma proporcional, no âmbito de uma avaliação sistemática e enquadrada, numa perspectiva actualista, de acordo com princípios e orientações que permitem estabelecer um padrão de justiça reconhecível e respeitado por todos os intervenientes e interessados.» A resposta governamental aludia, aqui, ao regime constante, desde 1981, da vigente Lei da Nacionalidade que permite já ao Governo «conceder a nacionalidade portuguesa, por naturalização (…) aos que forem havidos como descendentes de portugueses [ou] aos membros de comunidades de ascendência portuguesa», com dispensa dos requisitos gerais de residência duradoura em território português e de conhecimento suficiente da língua portuguesa.

Por outro lado, a resposta do Governo da altura admitia o seguinte: «A criação de um regime especial a aplicar especificamente a uma determinada comunidade, com raízes num passado tão distante, teria não só que ter por base um estudo histórico e uma análise aprofundada, com dados actuais de natureza estatística, suportada por um debate alargado na sociedade portuguesa, como sobretudo teria que ter em conta o equilíbrio necessário e o respeito pelas aspirações de outras comunidades de ascendência portuguesa, que remontam a um passado não distante.»

Mas a mesma resposta do Governo de então temperava restritivamente a aparente abertura, ao acentuar que este tem sido o «entendimento consolidado e constante do Ministério da Justiça, considerando que meras raízes históricas não podem relevar, per si, para fundamentarem o recurso ao regime excepcional previsto no n.º 6 do artigo 6º.»

Por seu turno, a resposta, quase simultânea, do Ministério da Administração Interna às questões do CDS-PP não acrescentava nada de relevante àquele entendimento do Ministério da Justiça – cfr. DAR, II – série B,  Nº.179/XI/1, Supl. 2010.07.23 (pág. 108-109).

O entendimento formado pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP divergia da resposta do Governo da altura, uma vez que a nossa interpretação é a de que o artigo 6º, n.º 6 da lei vigente era já base suficiente para decidir favoravelmente os pedidos de naturalização que fossem apresentados por descendentes das antigas comunidades de judeus sefarditas expulsos de Portugal. Considerávamos que os competentes processos administrativos deveriam ser instruídos com critérios suficientemente abertos, por forma a concretizar a justa reparação histórica aos requerentes que comprovassem por meio suficiente descender daqueles antepassados forçados ao exílio ou expulsos do nosso país.

Porém, convergíamos e convergiríamos na disponibilidade para encontrar e definir um regime especial, inspirado no espírito e na letra da lei em vigor, mas que, por conter previsão expressa dirigida ao caso dos descendentes das comunidades portuguesas de judeus sefarditas, evitasse conflitos de interpretação, fosse além da mera discricionariedade e revestisse, assim, adequada e desejável segurança jurídica.

O CDS-PP viu, assim, com satisfação, a apresentação pelo Partido Socialista do Projecto de Lei n.º 373/XII/2ª – Quinta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Nacionalidade) – que é o sinal certamente de já ter sido concluído o estudo histórico e a análise aprofundada a que se fazia alusão na resposta governamental de 2010.

Há, por isso, condições para avançar, no plano legislativo, num quadro desejável de amplo e alargado consenso político interpartidário.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º
Alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro

O artigo 6.º da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro, alterada pela Lei n.º 25/94, de 19 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 194/2003, de 23 de Agosto, pela Lei Orgânica n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, e pela Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 6.º

[…]

1-            […]

2-            […]

3-            […]

4-            […]

5-            […]

6-            […]

7-            O Governo concederá a nacionalidade por naturalização, com dispensa dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1, aos judeus sefarditas de ancestral origem portuguesa, através da demonstração da tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa, com base em requisitos objectivos comprovados de ligação a Portugal, designadamente apelidos, idioma familiar e descendência.»

Artigo 2.º
Regulamentação
O Governo procederá às necessárias alterações do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei n.º237-A/2006, de 14 de Dezembro, no prazo de 60 dias a contar da publicação da presente lei.

Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data de início de vigência das normas regulamentares referidas no artigo anterior.
Assembleia da República, 4 de Abril de 2013
Os Deputados,

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